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Inéditos

nunca ninguém: tem

Maria S. Mendes

 

nunca ninguém: tem

educação na infância:

uma nuvem não vem

com tradução: tempo

espaçado de frase feita

em branco: entretanto

em palavras-turquesa

céus amplos: digitinta

não cabe: impossível

meteorologia alguma


 

 

sobram fachadas: vizinhas

conversas vazias do bairro

de nada de pedra esfarelada:

tanto transparecem na tarde

alguma falta de interior

pose de ruína

despreocupada:

como caem os muros

às mãos do homem

demolidor:

 

telhados abrem

nossa falência

e sobram fechadas:

portadas honestas

uma osga

cimento

sem companhia

 

Ricardo Tiago Moura


Ricardo Tiago Moura nasceu em Coimbra, Junho de 1978. Publicou os livros Um gato para dois (Hariemuj, 2013), Epístolas a D. (não edições, 2013), 1 gato para 2 (não edições, 2015) e pequena indústria (Tea for One, 2016). Publicou também o livro-objecto Controlo de qualidade (ed. de autor, 2017). O seu livro Espaço aéreo (Arqueria, 2014) foi publicado no Brasil, mais tarde traduzido para Espanhol e Inglês e publicado no Peru (Amotape Libros, 2015) e Reino Unido (Carnaval Press, 2017). Tem publicado dispersamente poemas em revistas e antologias. Dedica-se também à colagem. Vive em Køge, Dinamarca. 

Trailer

Maria S. Mendes

 

TRAILER

 

 

o filme começa com um happy begin

 

será um flash-back o que se passa em mim?

e depois o tempo presente não sei se volta

 

cama grande ou divã?

acordar a dois

e nasce uma estrela

 

o primeiro adeus

a primeira clínica

a segunda clínica

shrinks, screens e boeings

 

de cá para lá

de lá para cá

sem passar por ti

 

un homme et une femme

bádábádábá

um casamento em paris, texas

 

a valentine nem queria acreditar

e tinha cárrádásss de raison

 

só nos ficaram as mil luzes de manhattan

dream a little dream of me

 

como era mesmo? aquele primeiro sonho

ah já me lembro

“eu sou uma flor que não envelhece”

e eu beijava-te

 

o primeiro beijo

 

FINE DEL PRIMO TEMPO

 

(saudade de viagens em itália

de filmes com intervalo

para fumar um cigarrinho)

 

SECONDO TEMPO

 

o primeiro restaurante

o primeiro disco

o primeiro gravador de chamadas

o primeiro emprego

 

é isto o cinema?

 

a bofetada de hiroshima

e se fôssemos ao egipto?

(tenho saudades da juleen compton)

lua cheia no yucatán

ela só dançou um verão

eu só bebo périer

le génie ou alors rien

não podemos viver juntos

nem separados

terna é a noite

dois apartamentos não nos bastam

é só uma lua de papel

the last moon of yucatan

the lost moon of yucatan

mas se acreditares em mim

este filme não acaba

toda a gente diz que te amo

à bâtons rompus

on parle on parle

falamos sem parar

mas não é só o que sabemos fazer

 

será que tudo não é senão uma colagem?

tu parles!

will you still love me when I’m eighty-four?

a última clínica

a última tarte aux myrtilles

 

- Lembras-te daquele filme?

- Qual?

 

(1.7.17)

 

 

Ramiro S. Osório

Formatei-me muito mais do que queria

Maria S. Mendes

 

Formatei-me muito mais do que queria

julguei resistir mas o crânio cedia

como uma bola de borracha ao sol.

Percebi isso ontem

no reflexo de uma janela:

a minha cabeça estava quase igual às outras todas.


 

 

 

Não, não sinto um grama

de poesia em todo o corpo,

e pesam-me as inevitabilidades mesquinhas.

O prazo do ketchup expirou há pouco

e todos me vão recriminar,

já sei, por eu não

reparar nesses números tão pequenos

que apesar do esforço me escapam

e fogem num resquício de distração distraída.

Estranha, a evolução da vida.

Há que continuar a olhar

a lata, o frasco, a casa.

Toda a mercearia me engoliu há muito.

E são e estão, tanto que não saberia.

Os filhos matam. Maridos também. Famílias assassinas a matar mulheres todos os dias.

 

Poesia não, mercearia.

Leonor Sá

 


Leonor Sá é conservadora de museu e mentora de projetos de proteção do património cultural. Doutorada em Estudos de Cultura pela Universidade Católica Portuguesa, com uma tese sobre os primórdios da fotografia judiciária, fez em tempos um mestrado cuja dissertação incidia sobre Kafka e a Utopia. Resultado: teve um percurso profissional kafkiano, mas nunca deixou a utopia - nem a poesia (senão morria).