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Num Hotel de Cinco Estrelas – II

Poemas de agora

Num Hotel de Cinco Estrelas – II

Maria S. Mendes

 

Num Hotel de Cinco Estrelas – II

 

No toucador de um Hotel de cinco estrelas

três grandes hastes de orquídeas 

umas rosadas outras cor de chá

do alto das suas jarras

olham-me como cãezinhos atentos

com suas bocas abertas.

 

Lá fora

as betoneiras mastigam ruidosas

o concreto

que depois se ergue em altas torres

onde se oferecem banquetes

em mesas enfeitadas com orquídeas 

com suas bocas abertas

como crocodilos ao sol

imóveis em seu perigo suspenso.

 

Ana Hatherly, “Num Hotel de Cinco Estrelas – II”, Itinerários. Vila Nova de Famalicão: Quasi Edições, 2003.  

 

Gosto deste poema porque se constrói através de jogos intrincados de simetrias imperfeitas. 

Formalmente, o poema divide-se em duas estrofes desiguais, uma vez que a primeira é composta por seis versos e a segunda alarga este número para nove. No entanto, tendo em conta o lugar expresso logo no título do poema, um hotel de cinco estrelas, é possível encontrar uma simetria que tem como eixo os três primeiros versos da segunda estrofe, referentes a um “lá fora”. Assim, o interior de um qualquer hotel onde o poeta se encontra durante a primeira estrofe é replicado na segunda estrofe, após ser transfigurado pela interferência do que acontece “lá fora”.

O lugar inicial no interior de um hotel, ainda que possa não ser um quarto, tem um toucador onde pousam as “três grandes hastes de orquídeas” que observam o poeta “do alto das suas jarras”. Estas flores concentram em si o papel de devolução do olhar que, por definição, fará parte do espelho, não mencionado, desse mesmo toucador. São também elas que oferecem ao poeta a primeira aparição das “bocas abertas”, que irá pontuar todo o poema, assemelhando-se, neste caso, a “cãezinhos atentos”. Se destas bocas ficamos a conhecer as cores, será, por sua vez, o som de outras bocas que “mastigam ruidosas”, no exterior do hotel, que irá interpelar o poeta, desencadeando uma meditação sobre a relação entre o trabalho estridente das betoneiras, existentes “lá fora”, e a construção de “altas torres/ onde se oferecem banquetes”, como poderá acontecer também em hotéis como aquele onde o poeta se encontra. 

A deglutição das betoneiras encontra eco nos comensais dos banquetes, enquanto se opera a transformação das orquídeas, que passam de “cãezinhos atentos” no quarto de hotel, para “crocodilos ao sol/ imóveis em seu perigo suspenso” quando decoram as salas de refeições. O requinte e conforto expectáveis num alojamento de luxo são desarranjados pelos jogos florais do poeta, ao estranhar a naturalidade deste locus amoenusda vida contemporânea. 

Forma-se assim um coro de bocas que permanecem abertas, alternando entre o silêncio e o ruído, o zelo e a ameaça, consoante a leitura do poeta, que as observa e escuta nos seres e objectos que o rodeiam, à procura do seu discurso visível. 

Sara Campino


Sara Campino divide-se entre o trabalho em arquitectura e a investigação em literatura. Descobriu a sua paixão pela poesia quando reparou que guardava certos poemas na memória à espera de conseguir compreendê-los.